terça-feira, 4 de novembro de 2014

"A BANALIDADE DO MAL"

"Um monstro ou um homem simples"


EDUCAÇÃO MORAL: CONTRIBUIÇÕES ARENDTIANAS
“A BANALIDADE DO MAL”

 

“Eichmann (O monstro?) é encontrado quinze anos após o final da Segunda Guerra Mundial. Ele era o homem mais procurado do mundo, e após ser preso e sequestrado na Argentina, agora será julgado em Jerusalém”. Essa notícia chamou a atenção do mundo inteiro em 1960, mas principalmente da filósofa e jornalista judia Hannah Arendt, que, enviada por um importante jornal americano, foi ver de perto aquele julgamento, onde percebeu que havia muitas falhas nesta “Casa da Justiça” e algumas perguntas já começavam a pipocar em seu inconsciente: Por que não levaram o réu para ser julgado na Alemanha, que é o seu país de origem, ou então na Argentina, que era onde ele residia, ou até mesmo num tribunal internacional? Israel faria Justiça a um monstro? Se for um julgamento que todos sabem o final, então, para quê julgamento? Afinal, ele era considerado “um monstro” em Jerusalém, sem nem mesmo saberem em que grupo de criminosos ele se encaixava. Entretanto, ao buscar um homem frio, inescrupuloso, bárbaro, Hannah encontrou um homem comum. Uma pessoa que trabalhava para pagar suas contas e que no final do seu dia, voltava para casa e vivia uma vida tranquila como bom pai, bom marido, um funcionário medíocre do inescrupuloso nazismo alemão.


A obra “polêmica” de Hannah Arendt colocou às claras esses “tempos sombrios” vividos na Alemanha nazista e considerava essa “massa assassina”, como assustadoramente normal e desprovida da capacidade de pensar. E foi isso que desagradou o povo judeu, pois ela também denunciou certa falta de resistência e passividade judia e alemã diante dessa tragédia que foi o Holocausto. Ela acusou a elite judaica de ingenuidade e até mesmo de “cumplicidade” com esse terror sem precedentes e nem procedentes. Ela disse que o povo alemão foi omisso e conivente, os políticos do pós-guerra não puniram os funcionários da burocracia nazista que continuaram a trabalhar em órgãos do governo. Arendt foi mal interpretada pelo povo judaico do mundo inteiro, mas tudo ficou bem claro para nós (Grupo), que a autora não estava de acordo com as atitudes “antissemitas” daquele réu, e também nos fez reconhecer que ele não tinha muita opção. Ex: O atacante Romário, na Copa do mundo de 1994, disse que o time obedecia fielmente ao técnico Carlos Alberto Parreira, mas quando percebiam que a ordem era “burra”, não obedeciam, e ao final de cada jogo, tudo dava certo. Tanto deu certo, que até foram tetracampeões do mundo. Porém, no nazismo havia apenas duas opções: Ou Karl Adolf Eichmann obedecia ao “Terceiro Reich”, que o havia designado para o projeto a “Solução Final”, ou se colocaria na condição de “inimigo” de Estado, e isso significaria a sua própria destruição. Daí que a justificativa de Eichmann seria compreensível: “Ele só cumpria ordens”. E, nesse esquema liderado por Adolf Hitler, quem se atrevesse a desobedecer, assinava a sua própria sentença de morte, morria com um tiro na cabeça.


O filme: “A solução final”, baseado no livro “Eichmann em Jerusalém”, de Hannah Arendt foi considerado pelo nosso grupo, bastante esclarecedor, pois realmente, nos fez refletir sobre este homem que todos achavam ser um “monstro”, devido ao grau monstruoso de seus atos. Ele era o encarregado pela logística da locomoção dos judeus para os campos de concentrações, e lá, nesses campos, os judeus seriam exterminados em câmaras de gás e depois cremados em fornalhas feitas especialmente para eles. Na verdade, Eichmann cumpria a sua função e fazia tudo perfeitamente como lhe era ordenado.


Gás utilizado pelos nazistas para asfixiar a
maioria dos judeus nos campos de concentração.
Eichmann, comprovadamente, não era um doente mental, nem um alienado ideológico, muito menos um endemoniado. Se lhes atribuíssem uma dessas personalidades, então poderia ser dado como teoria explicativa para o grande mal cometido por ele. No entanto, ele agia sempre dentro da normalidade legal de seu país, e foi isso que assustou a filósofa Hannah Arendt. Eichmann não tinha o povo judeu por inocente sendo transportado para o matadouro, onde, na maioria das vezes utilizavam o gás "Zyklon B" para que fosse inalado por essa massa até a morte. Talvez, se ele recebesse uma ordem de agir conforme a sua própria vontade, os libertariam. Posteriormente seria considerado um herói nacional, se porventura vivesse num Estado justo. Mas ordens que lhe chegavam através de memorandos era para que enviasse os judeus para os campos de concentração. Então ele via nos judeus a face dos inimigos de seu país, e a ordem expressa era, “Envie-os para o extermínio”.

Essa é a tese central da autora com o conceito de “banalidade do mal”, pois o réu apresentou-se como um “homem virtuoso”, era um exemplo de pessoa bem comportada. Eichmann, segundo Arendt, “não” era um monstro. Ainda que o resultado de suas ações fosse monstruosamente macabro, ela o denominava como “uma pessoa normal” e a sua conclusão desagradou a muitos, pois esperavam que ela, sendo judia, não se comportasse dessa maneira, chamando um carrasco nazista de pessoa normal.

Segundo Arendt, Eichmann se distinguia dos demais homens comuns porque representava o maior exemplo de assassino em massa, porém, ao mesmo tempo, um perfeito homem de família. A promotoria de acusação o via como “o motor” do Holocausto, Arendt concordava com a defesa e o descrevia como um homem subalterno, transformado num funcionário desumanizado ou mera “engrenagem” ligada à solução final da questão judaica, nunca seria um motor. Ele agia sempre ancorado por leis e memorandos e, sabia que poderia ser substituído por outro funcionário, que faria a mesmíssima coisa em seu lugar, pois Eichmann estava cumprindo a sua função no Estado ditador de Adolf Hitler, portanto queria fazer o melhor por seu país. Sua função não era de responsabilidade intelectual onde pudesse tomar alguma decisão. Se não a executasse é que seria responsabilizado.

Em nossa opinião, Hannah Arendt foi muito correta em seus conceitos e em suas conclusões, ao dizer que qualquer pessoa que quiser ser fiel cumpridora de ordens, sejam essas ordens certas ou erradas, burras ou não, dentro de uma ditadura totalitarista, obrigatoriamente, terá que agir de acordo com a “banalidade do mal” que lhe for imposta.

Hannah Arendt fez um alerta sobre a possibilidade inegável de que crimes similares poderiam ser cometidos no futuro. Mas não é o castigo (punição) no homem que impedirá essa provável aparição de novos holocaustos em ditaduras totalitaristas de governos por aí a fora. Segundo Arendt, é preciso repensar a educação moral e determinar o que é que pode motivar uma pessoa comum se tornar uma aberração. Em seu livro “A vida do espírito”, ela desqualifica explicações atribuídas ao perfil de um “monstro nazista”, pois em Eichmann, não foram encontradas grandes convicções ideológicas, nem partidárias, ele não era enfermo, nem demoníaco. Eichmann não tinha tempo, nem vontade de se instruir. Jamais conheceu o programa do Partido Nacional Socialista e nunca leu Mein Kampf. Eichmann declarou várias vezes que estava com a consciência tranquila, pois cumprira o seu dever e sabia que era isso mesmo que deveria fazer. Nem mesmo homens com sólida formação moral, como o papa Pio XII, o rabino Leo Baeck e o ministro protestante Heinrich Gruber conseguiram compreender o verdadeiro significado do nazismo na Alemanha.

Eichmann, na opinião de Arendt, tinha uma ausência do pensamento com relação aos seus maus atos. Segundo ela, essa incapacidade de pensar do indivíduo oferece às lideranças totalitaristas, um ambiente privilegiado para o fracasso moral desse indivíduo que, com certeza, fará tudo o que o “seu mestre” mandar. Na concepção arendtiana, essas barbáries cometidas por Eichmann não se fundamentaram na inveja, no ódio, na cobiça e nem mesmo na falta de conhecimento (estupidez), mas sim na irreflexão. Essa é a hipótese central de Hannah Arendt que delineia uma relação entre a banalidade do mal e o vazio do pensamento, e ela disse: “Nunca um homem está mais ativo do que quando nada faz, nunca está menos só do que quando está sozinho consigo mesmo”.

A atividade de pensar significa rompimento com o mundo, sem trocar esse mesmo mundo por outro melhor. A busca de um mundo mais puro ou mais profundo, como, segundo Arendt, erroneamente indica os pregadores da tradição metafísica.

Hannah Arendt - Filósofa e jornalista
Segundo o autor deste artigo dado pelo professor, como objeto de nosso estudo – Marcel Andrade, seria preciso refletir sobre valores morais mais fundamentais como: justiça, igualdade, liberdade, solidariedade, diálogo e tolerância, ou seja, uma educação moral deve entender a banalidade do mal e enfrentar diligentemente a prática do mal, desfazer e denunciar as continuidades irrefletidas existentes entre o mundo cotidiano e o mundo dos clichês, no qual, qualquer pessoa pode assimilar com muita facilidade. Andrade revela que Arendt estava convencida de que o mal não tem raízes, nem profundidade. O mal é como um fungo, sem raiz, nem semente, mas espalha-se sobre uma superfície e do nada pode vir a ser extremo com consequências incalculáveis e desastrosas e, no caso de Eichmann, monstruosas. Daí parece claro que uma educação moral não deve se preocupar apenas com conteúdos moralizantes a serem incluídos no currículo escolar. As contribuições arendtianas na educação moral deve, sobretudo, apostar, sem garantias ou surpresas, no pensamento enquanto exercício de descontinuidade com o cotidiano e significação de um mundo onde aparecer é a condição básica para garantir a sua própria existência. Somos alguém, porque aparecemos dentro da perspectiva e sentidos dos outros. E nesse sentido, Sócrates é apresentado como o recorrente modelo de filósofo, pois soube manter-se nesse diálogo: “A possibilidade de se expor ao vento do pensamento e desarrumar nossas pequenas certezas para abrir outras possibilidades, apesar dos riscos evidentes”. Sócrates conseguiu unir o agir e o pensar, mantendo a experiência e a intimidade necessária para entender que o pensar é um distanciamento do mundo e uma reaproximação sempre renovada para entendê-lo, para que haja a possibilidade de favorecer um ambiente que desenvolva a incapacidade de fazer o mal e, assim, criar um ambiente propício para a educação moral. Educar é ressignificar o mundo em que habitamos, valorizando a atividade de pensar, privilegiando o pensamento e não apenas a fala, a leitura e o trabalho de grupo. Deve-se instigar o educando para que ele tenha o diálogo consigo mesmo, destacando uma reflexão pessoal, interna e desinteressada, mas capaz de dar significados ao mundo que habitamos.

É preciso criar um ambiente desfavorável para essa terrível “banalidade do mal”, pois, desta forma nos protegemos das intolerâncias preconceituosas e assassinas de ideologias de ditaduras totalitaristas.  Que sejamos capazes de formar mais pessoas como Sócrates do que como Eichmann e educar os nossos filhos para que absorvam muito mais os pensamentos no campo das possibilidades do que das certezas. Ideologia, se o povo pensar, acaba! Ditaduras nunca mais...


“Quando o governo é justo, o país tem segurança”. (Provérbios 29:4)
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*Trabalho de Aproveitamento das disciplinas: “ATPA e SEMINÁRIOS TEMÁTICOS” - Exigido pelo Prof.º Ms. Edson Antônio Ortiz de Camargo. Entregue pelo Grupo *Os 7 Monstrinhos.
Escrito em 01/11/2014
Texto de Álvaro João dos Santos

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